Ultradireita monta cerco no Congresso e busca emparedar presidenta
Por Redação - de Brasília e São Paulo
Os votos ainda não esfriaram nas urnas, após declarada a vitória da presidenta Dilma Rousseff para um novo mandato, até 2018, e as forças mais reacionárias da sociedade brasileira já se articulam. Partidos de centro-direita, entre eles grande parte do PMDB e do PDT que, presumidamente, deveriam integrar a base aliada, articulam um bunker para deter as reformas sociais defendidas pela esquerda que, também em tese, venceu as eleições deste último domingo. Os parlamentares conservadores, porém, formam a maioria absoluta do Congresso, o que significa um jogo pesado para a presidenta, reconduzida ao cargo por uma diferença de apenas 3,5 pontos para o adversário tucano, Aécio Neves.
Na véspera, a bancada do PMDB na Câmara dos Deputados aclamou seu líder, Eduardo Cunha – integrante da extrema-direita no Estado do Rio – como candidato à presidência da Casa. O anúncio ocorre três meses antes da eleição, em um claro movimento de pressão ao PT e o governo para que aceite a candidatura do peemedebista, desafeto declarado da presidenta Dilma. A próxima eleição para presidente da Casa será em fevereiro de 2015, quando os novos deputados tomam posse.
A estratégia da bancada peemedebista da Câmara ocorre à revelia da cúpula do PMDB e visa a atrair partidos de oposição, na queda de braço entre o governo e a atual legislatura. Além de não ter a simpatia da presidente reeleita Dilma Rousseff, Cunha não cultiva boas relações com o vice-presidente Michel Temer, que também preside a legenda. Até agora, governo e PT, que terá a maior bancada da Câmara em 2015, estão apenas assistindo aos movimentos de Cunha, o que pode colaborar com sua estratégia de pavimentar o terreno para a candidatura até um ponto irreversível. Aliados de Cunha romperam o acordo com os petistas, que previa um rodízio no comando da Câmara. Agora, seria a vez do PT apontar um candidato à Presidência, com o apoio do PMDB.
Vara curta
Os parlamentares da direita sentem-se fortalecidos, após impor meia derrota ao governo, dois dias depois da reeleição, numa matéria carregada de simbolismo democrático como a que previa a criação de conselhos populares para debater e aperfeiçoar as medidas governamentais. Após acusar o ato de “bolivarianismo”, o presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves, colocou o tema em pauta quando a centro-direita formava maioria em Plenário. O decreto presidencial apenas regulamenta algo que é lei há 11 anos. Tratava-se apenas de mandar um duro recado à presidenta, ainda que signifique cutucar a onça com vara curta.
Na análise do jornalista e blogueiro Rodrigo Vianna, “o governo Dilma terá a dura tarefa de se equilibrar entre dois fogos. De um lado, está a força das ruas – que empurrou Dilma para a vitória. De outro, está o “centrão” no Congresso. Na Câmara, a centro-esquerda (PT, PCdoB e mais alguns votos no PSB e PDT) tem menos de 100 deputados. Isso mesmo: cerca de 20% da Câmara”.
“O PMDB – que seria o aliado de “centro” a garantir estabilidade – envia sinais de rebelião. Mas Dilma não pode prescindir do centro para governar. O PSD de Kassab deve assumir papel importante. Pode-se aglutinar, em torno do PSD, uma base de apoio de centro que ofereça a Dilma um contraponto, se o PMDB de Eduardo Cunha insistir na chantagem. Na teoria, PSD/PR/PP/PDT podem formar um bloco com mais de 120 deputados (o dobro do PMDB)”, acrescenta.
Na matemática política, porém, não há resultados exatos. “Se ceder demais ao centro no Congresso, Dilma desagradará as ruas – onde colheu o apoio que lhe garantiu a vitória numa campanha em que o cerco midiático conservador chegou a níveis semelhantes ao de 1954, no ataque final a Getúlio Vargas. A situação de Dilma pode encontrar paralelo também no governo Jango. Ele era pressionado pela esquerda – para avançar nas Reformas de Base. Só que o aliado PSD (partido de centro), rechaçava as reformas. Jango queria a reforma possível – que pudesse ser aprovada no Congresso. Pressionado pela esquerda, foi para o tudo ou nada. Perdeu apoio do PSD, e foi derrubado por um golpe em 1964″, lembra Vianna.
O PT, lembra o articulista, “até hoje abdicou da rua, resolvendo tudo com conciliação. Esse tempo acabou. Mas não sejamos ingênuos, nem extremistas. A negociação segue sendo necessária. A esquerda não tem força para impor sua agenda ‘pura’ ao país. Apostar nisso é apostar num desastre”.
Ministério complicado
Um dos mais poderosos instrumentos de negociação que a presidenta conserva, na tentativa de formar uma maioria estável no Congresso, a caneta de que dispõe para assinar a formação do próximo ministério está carregada e pronta para entrar em ação. Dilma, segundo o editorialista da agência brasileira de notícias Carta Maior, Saul Leblon, “fará de seu novo ministério uma trincheira de competência técnica, mas também um instrumento de ação política para abortar cercos e superar flancos revelados antes e
depois das urnas”.
“O PT, partidos aliados e movimentos sociais naturalmente serão contemplados: foi deles a responsabilidade pela candidatura vitoriosa em outubro. Mas o setor empresarial também será incorporado. A concessão de um governante vitorioso é uma lâmina de dois gumes. Um deles fatia um pedaço do seu mandato para o mercado; o outro fatia um pedaço do mercado que os inconsoláveis pelotões do revanchismo querem perfilar na ordem unida do terceiro turno contra Dilma”, acrescentou.
Leblon, na defesa de um mercado mais simpático às reformas de base, cita exemplos como os de Luiza Trajano, dona do Magazine Luiza, ou o do aventado para o ministério da Fazenda Luiz Trabuco Cappi – “presidente de banco que pensa como a empresária, não por benemerência, mas de olho no avanço do crédito no país”. Segundo o colunista, eles “podem ser acomodados em um governo de composição acossado pelo terceiro turno golpista, associado aos rentistas que preferem lucrar sem produzir. Acercar-se de anteparos não antagônicos à construção de um desenvolvimento convergente é o que qualquer governante progressista sempre fez e fará, após renhida batalha eleitoral”.
O cerco à presidenta, no Congresso, porém, segundo o cronista de Carta Maior “não é uma miragem”. Há, segundo afirma, “a pretensão conservadora de isolar Dilma em uma Guantánamo institucional, e impedi-la de governar”.
“As operações de assalto estão explícitas nas manchetes ressentidas das horas que correm, nos perdigotos expelidos de colunas sulfurosas e na rejeição da Câmara ao projeto que institui conselhos populares –organismos consultivos para o aperfeiçoamento dos programas sociais do governo. São sinais do tipo: às favas as urnas! Reverter a escalada dos liberais que não se libertam jamais da UDN embutida nas veias, não se resolve com um ministério puro sangue. É mais difícil que isso”, afirma.
Segundo Leblon, as urnas deram mais quatro anos de governo a Dilma, após um período de falhas severas na condução política do país:
“Se falhar de novo, dificilmente haverá uma chance tão cedo outra vez”, conclui.
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